segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Crônicas do Professor Altair Malacarne - Um Caminhão Alfa-Romeo



UM CAMINHÃO ALFA-ROMEO

Em 1950 já tinha estrada de carro entre Colatina, Barra de São Francisco e Nova Venécia (ES); as carretas INTERNATIONAL  e FORD a gasolina passavam todo dia na rua empoeirada de São Domingos (do Norte) levando árvores inteiras para serem serradas em Colatina; eram momentos de alegria e encantamento escutar de longe aquelas furonas gemendo e carregado um peso enorme, lotado com alavancas de aço e espeque de ipê por aqueles homens de aço que ainda viajavam em cima das longas toras; e o precioso café produzido nas humosas terras descobertas com as derrubadas era levado também por camiõezinhos a gasolina, geralmente americanos; a glória de um toco era quando ele conseguia arrastar 120 sacas piladas; na subida do Canaã, às vezes,  os ajudantes eram obrigados a saltar e subir a pé, carregando um ‘macuco’ para uma emergência.

Um dia pintou na boca da rua de São Domingos do Norte um caminhão gigante; e o motor do bicho fazia um barulho enorme, provocava uma trepidação que tremia os para-lamas da boleia;  eu e a meninada da escola corremos; pra onde ia aquele mamute? Mas, de repente, ele deu um espirro grande e parou; de dentro da cabine saíram uns truculentos e começaram a descarregar tudo no canto da rua: tecidos, remédios,  garrafas dentro de sacos, espingardas, munições, o diabo; e o povo chegando; então, os estranhos começaram o oferecer, por preços tentadores; ficaram ali por uns 3 dias, prazo bastante pra novidade se espalhar e a mercadoria quase acabar.

Fiquei sabendo depois: era um arranjo importado da Itália por gente interessada em construir aqui  uma indústria nacional de ‘brutos’,  que se tornariam famosos disfarçados com o nome de FENEMÊ; eles não saem mais; temos outros ‘brutos’ inclusive de origem americana; os ALFA-ROMEO, no entanto, deixaram muitos ‘órfãos’, hoje reunidos em clubes de ‘ALFEIROS’.

Altair Malacarne 
SGP, 16.12.2013

Estrada Real: São João Del Rey X Belo Horizonte via BR 381



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segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

TABU


Ela é assunto proibido no meio dos Harleyros. Seja pela rejeição natural da tribo às outras marcas ou devido à algo mais, algo próprio dela. Quando, por um motivo ou outro, seu nome vem à tona no grupo, alguns, mais afoitos, apressam-se em atacá-la, denegrindo sua fama como fizeram com Geni, na música do Chico. Outros, mais comedidos e, talvez, por conhecerem melhor sua natureza e saberem com mais propriedade do que ela é capaz, preferem o não incriminador silêncio.
Mas fato é que ela suscita no Harleyro (talvez por que este conheça e goste de boas máquinas) os desejos mais íntimos, as fantasias mais proibidas, algo que a “patroa” não é capaz de lhe proporcionar, ou não na mesma forma e intensidade.
Certa vez, um colega (que resolveu assumi-la), disse que o que nela lhe encantava era a silhueta frontal, cujos cilindros, simétricos e opostos lembravam-lhe os seios, e que seus dois logos no tanque mais pareciam os olhos azuis da mulher amada.
Em outra oportunidade, um irmão apareceu com “a outra” em uma conhecida e respeitada confraria na Praia do Suá, Vitória. Trataram logo de cobri-la dos pés à cabeça com o manto sagrado da patroa, afinal sua ostentação ali era um ultraje.
Exageros e piadas à parte, fato é que ela exerce um estranho sentimento no Harleyro, misto de desejo e pecado, fascínio e traição, pois como conciliar as duas? A patroa não admite concorrência! Ela tem personalidade forte, espírito de águia! E o Harleyro tem a fidelidade islâmica, e a pena para as “espetaculosas” é o apedrejamento, até a morte.
Frente à este paradoxo, o Harleyro segue sua sina, cultuando e mistificando aquela que lhe proporciona ser quem ele é, mantendo seu status e poder patriarcal, e, ao mesmo tempo, admirando em silêncio aquela que é capaz de levar seus “senhores” ao prazer extremo fora da trivialidade do asfalto, até os mais longínquos e inacessíveis pontos do planeta.